quarta-feira, 30 de março de 2011

vamos deixar de nostalgia
esse baixo astral
garantia de sucesso é agora
na terceira guerra mundial
Ser humano é o esforço

diário

do imprevisível.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Domingo

A luz do quarto acesa lá em cima, bem acesa, eu pensei e pensei também que porra eu estava fazendo ali na rua com aquela chuva grossa, longe de casa, em pleno domingo... Domingo é dia pra passar de pijama, porta trancada, celular desligado... Domingo é dia pra ver qualquer programa imbecil na TV, pedir uma pizza e afundar na cama. Mas de qualquer forma eu estava ali do outro lado da rua, encharcado, arregalado, tinha que ser agora.
O porteiro teve um susto com o meu grito, meio surpreso, meio puto. É, domingo não é dia pra essas coisas mesmo. Foda-se.

Você me abre a porta toda sorrisos.
-Olha só, que surpresa agradável...!

Eu nem respondo, você quer um beijo, eu não... Beijo mesmo assim.
-Que, que foi?
-Eu precisava falar, não dá mais...
-Não dá mais o que?
Senta aí, que a gente vai conversar.

Dá pra sentir você engolindo seco daqui de onde estou, engole mesmo.
-Olha, foi alguma coisa que eu disse semana passada? Não foi de maldade, era porre...
-Nem, olha, não dá mais... Eu não gosto de você, acho que nunca gostei.
-Pera aí, o que é isso? O que aconteceu?
-Não aconteceu nada, é isso... Não tenho mais saco de ficar nesse protocolo todo, e pro seu bem é melhor terminar tudo logo aqui.
-Mas como assim?! O que aconteceu?!
-Nada aconteceu. Nada acontece. Não gosto de você.

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[ ]

-Bom, é isso, vou indo.
-Espera...
-Hum...

[ ]

[ ]

-É melhor eu ir agora, de verdade.
-Nem um pouco?
-Hum?
-Você não gosta nem um pouco de mim?
-Já disse que não, não acho certo continuar desse jeito...
-Nem um pouco? Então o que foi isso? O que foram esses meses?
-A gente viveu juntos alguma coisa. Foi bom. Acabou.
-Mas como? Assim do nada? A gente dormiu aqui no sofá anteontem...
-É. Foi bom, muito bom...
-Então, "não dá pra ser assim" como? Você me come e vai embora, assim sem mais nem menos?
-Te como? Isso por acaso é uma via de mão única?! Você estava me fazendo um favor por acaso? Foi bom. Acabou... E já passou da hora de eu voltar pra casa.

Me levanto, você me crava as unhas no antebraço,essas unhas... Domingo não é dia pra isso.

-Fica, isso não é certo.
-Claro que é, por que não seria?
-Porque não é. Não é assim que se termina uma coisa dessas.

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-Eu não devia ter vindo aqui.
-Mas veio, agora a gente vai resolver isso. Só não é assim...

Você me enfia a mão por dentro da calça. Cacete, como eu queria estar em casa vendo algum programa imbecil com dançarinas gostosas rebolando...

-Olha só, até parece que você queria ir embora agora mesmo.
-Para... Já disse que não quero...
-Ah, é?

Dançarinas, apresentadoras de mini-saia, campeonato paulista, pizza, as atrizes...

Eu não tenho a coragem de tirar a sua boca daí, desse jeito, eu sei. Eu sou fraco. Domingo não serve pra essas coisas, mesmo. Você olha pra mim com um sorriso de sacanagem no rosto, isso vai dar merda, eu penso...

Quando chega a hora da verdade você engole a porra toda e continua entretida comigo até eu ter aflição do meu próprio pau, puta que o pariu. Domingo.

Num arranque de realidade eu coloco a calça e vou afivelando o cinto enquanto abro a porta.

-Não dá. Desculpa... Até.

Estarrecida. É, eu disse.

Vou abrindo o portão do prédio. Atendo o celular. Domingo não é dia pra celular.

-Você vai embora mesmo? Certeza?
-Vou. Já disse.
-Volta aqui, só queria te dar um sorriso, não faz assim.

[ ]

-Pro seu bem... Guarde esse sorriso pra outra pessoa, tchau.

Meus sapatos encharcados. Que caralho, acho que esqueci a janela do quarto aberta.